quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Anotações à Nova Lei sobre a Prescrição Penal

Com a ocorrência de um crime, nasce para o Estado o ius puniendi, ou seja, a pretensão punitiva. Contudo, não obstante as exceções previstas no art. 5o, XLII (prática de racismo) e XLIV (ação de grupos armados, civis e militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático), da Constituição Federal, a pretensão punitiva não pode eternizar-se.

A legislação penal estabelece critérios que limitam o exercício do direito de punir do Estado, a partir da fixação de um lapso temporal dentro do qual poderá a pena ser perseguida e/ou executada, o qual varia de acordo com a gravidade do crime e a sanção aplicada, conforme art. 109 do Código Penal.

Existem duas maneiras de fazer o cômputo da prescrição: pela pena in abstrato (a pena máxima cominada ao crime) e pela pena in concreto (pena aplicada na sentença condenatória). Ainda, existem duas espécies de prescrição: a prescrição da pretensão punitiva (pode ocorrer antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória) e a prescrição da pretensão executória (pode ocorrer após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória).

No dia 6 de maio de 2010, entrou em vigor a Lei n. 12.234/2010, que trouxe substanciais alterações em alguns dispositivos do Código Penal referentes à prescrição.

A primeira alteração introduzida pela nova lei refere-se ao prazo prescricional nos crimes em que o máximo da pena não excede a 1(um) ano de prisão. Anteriormente, conforme o art. 109, VI, do Código Penal, a prescrição do ius puniendi do Estado ocorria em 2 (dois) anos; agora, ocorrerá em 3 (três) anos:

Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no parágrafo 1o do art. 110 deste Código, regula-se plo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:
[...]
VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.

Portanto, caso a pena in concreto aplicada ou a máxima cominada seja inferior a um ano, é preciso que haja o transcurso de três anos entre os marcos interruptivos da prescrição (art. 117 do CP) para que ocorra a prescrição penal.

Outra alteração ocorrida foi na chamada prescrição retroativa. Na antigo sistemática do Código Penal, o termo inicial da prescrição retroativa era a data de ocorrência do fato, o que está vedado segundo a nova redação do art. 110, parágro 1o, do CP:

Art. 110. [...]
parágrafo 1o. A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa.

Como se percebe, na nova sistemátiva do Código Penal, a prescrição retroativa somente pode ocorrer entre a data do recebimento da denúncia ou queixa (art. 117, I, do CP) e a causa interruptiva posterior, pronúncia no caso do procedimento do júri (art. 117, II, do CP) e a publicação da sentença penal condenatória (art. 117, IV, do CP).

Portanto, entre a data do fato e o recebimento da denúncia ou da queixa, continua existindo apenas a prescrição computada pela pena in abstrato, afastando-se a retroativa, que era computada pela pena in concreto. Essa alteração proporciona um aumento no prazo para a condução das investigações na fase policial, já que, recebida a denúncia (momento em que se analisa a viabilidade da instauração do processo penal), não existe mais a possibilidade de reconhecimento da pretensão punitiva do Estado.

Com relação ao direito intertemporal, deve-se considerar que a natureza jurídica do instituto da prescrição, para o ordenamento jurídico brasileiro, é de direito material, motivo pelo qual não poderá retroagir aos fatos anteriores ao dia 6 de maio deste ano, pois as alteraçoes são desfavoráveis aos acusados, sob pena de violação do princípio da legalidade.

Na prática, portanto, o operador jurídico deve estar atento para não haver a aplicação da nova lei a casos anteriores a 6 de maio de 2010, postulando a adoção da sistemática anterior, por ser mais favorável ao réu. Para finalizar, destaca-se o fato de ser possível alegar a ocorrência da prescrição a qualquer momento e em qualquer instância.

Por Marcelo Marcante Flores (publicado na Revista IOB de Direito Penal e Processual Penal, n. 62, jun-jul/2010)

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